quinta-feira, 17 de julho de 2008

Deserto

Alguma coisa me diz que se isso acontecesse a vida me daria alta.
Estaria livre de todas as incertezas e medos, não me preocuparia mais em convencer, em ser mais forte. Não falaria alto, jamais ficaria rouca por maus sentimentos.
Pensei e olhei, as lagrimas ainda escorrem em sua face. Pergunto como não esturrica se por vezes se mostra tão ressequida.
Nunca vi tanta água saída de uma mesma fonte, mas assim como no deserto, o chão seco dá vida aos cactos.
Seu codinome? Orquídea.
Incoerentes somos todos. Até os nomes...
A necessidade que tem é imensa, sua boca é gigante e o ouvido menor que uma cavidade microscópica.
Encontrei uma bela teoria, ela diz; "A cozinheira exerce o papel de filha e de mãe. É quem recebe o alimento, como a cria, e posteriormente os prepara oferecendo aos demais, representando a geradora." O pensamento passou desapercebido, mas algo ficou.
Rotineiramente vou à casa de uma amiga e por acidente Orquídea está lá, em todos os momentos. Ao menos eu, nunca vi essa casa sem ela.
Ali, a sala é cheia de coisinhas coloridas, a arvore esta sempre enfeitada, o sofá cheio de almofadas fofas. Se eu fosse um gato dormiria eternamente pensando estar sobre algodão.
Lá a fonte se ilumina e jorra seus segredos. A cavidade se abre, notamos que aumenta, mas não compreende! É vazio, sem ar, não produz ao menos eco. Se algo realmente entrasse o deserto umedeceria pelo simples fato de perceber que sua falta provém de si próprio. Nenhum sol é tão forte sobre esse solo, a não ser o próprio solo.
Costumo ouvir nesta sala multicolor que se quero algo diferente tem que partir de mim, mas chega um ponto que não posso mais. Dar tanta água me aborrece, ela não é útil, é apenas vaidade de quem recebe. Chega um momento em que não se pode mais modificar tudo em si próprio, o outro também tem que fazer algo.
O deserto é tão egoísta que seca por querer toda água do mundo.
Os que cozinham são felizes, o dom do alimento é puro, alegra distintos seres com um único feito. Para mim o papel figurado de cozinheira não cabe mais. Por longos dias fui múltipla, rega, luz, professora, protetora, cobertor. Hoje sou tudo isso, mas sem valor algum, na forma de voz que silencia num ouvido surdo.
Não me assemelho a um deserto infrutífero, sou tentativa de ressuscitá-lo.
No dia em que a rouquidão passar, será por que passou a surdez, a sala das almofadas realizará aquela mágica, seremos voz e escuta em qualquer lugar, em qualquer luz, o cacto virará margarida, e o deserto rio, a cozinheira será para todos apenas quando puder doar ou receber e as lagrimas não mais virão para chocar e magoar, serão acolhidas em seu momento de dor, assim deixara de ser protagonista de teatro e virará sentimento de verdade.
No dia em que a mágica surgir, a vida me dará alta.


Beatriz Lopez.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Anamnese

Não sou dona de promessas para guardar as que me oferecem, escuto as dele, mas soam como mentiras. Nem mesmo sei se pago as minhas, quem diria que ele saldaria as suas próprias?
A comida não digere, pareço com um recém nascido que se não regurgitar pode respirar o próprio vomito e morrer do único alimento que o faz sobreviver. Que me faz sobreviver...
Sobre... Alem... Continuar... Resistir... Respirar.... Escapar, escapar, escapar... Escape, escapou, escapei. Escapei?
Parece que sempre que chego mais e mais perto tudo, absolutamente tudo escorre das minhas mãos como se fosse água!
Escapa como escapam os sonhos... Como se perde o desejo de criança de sonhar... Como se desconhece o que sente de um filho que acaba de nascer...
Não adiantaria gritar, a mãe já cresceu faz tempo, o pai foi embora semana passada - Engraçado parece que foi há anos atrás.
Ontem ele disse que sim, jurou, murmurou amor e tudo se esvai...
Quem disse que é fácil se livrar das palavras? A dedicação à memória pode se tornar o pior afeto no amor, ela ludibria, engana, ilude. Conheço as raízes das lembranças, a intimidade invisível de uma corrente chamada apego.
Olho minhas mãos e não entendo, nem mesmo as vejo, tento sentir o cheiro da água, mas só consigo engasgar. Engasgo com minha própria saliva, engasgo com coaxados, com patas verdes que tentam entrar e sair de dentro da minha boca, garganta, estômago. Pula, pula, pula, pula, pula, pula....
Guardo como se fosse um filho, filho fruto do desespero, efeito de promessas de memórias.
Achava que podia fugir e na realidade me enganei achando que essa palavra fosse sinônimo de desfazer, desprender.
Bem feito, Quem foge de si próprio acaba nas garras escuras do desconhecimento, na manutenção de situações indesejadas.
Acho que fugi de mim mesma, não por acreditar em promessas, mas por não cumprir as que fiz pra mim mesma, prometi até defesa, mas minha guarda esta aberta e minhas feridas expostas.
Nada me deve, nem você, nem ele e nem ela. São só palavras, só reminiscência, anamnese ou pra ser mais suave
Filos.


Beatriz Lopez.